top of page

Líder, quem é o culpado?

Acabei de ler o livro “A Verdade sobre o Caso Harry Quebert” de Jöel Dicker. Fantástico.

Nele, um escritor investiga a morte da jovem Nola Kellergan, ocorrida há 30 anos, e tenta inocentar seu amigo, também escritor, Harry Quebert, preso e acusado de assassinato. As provas pareciam incontestáveis!


Com muita habilidade, o autor nos faz suspeitar, ao longo da história, de praticamente todos os personagens que nela aparecem! Uma informação aqui, um fato novo ali, e vamos mudando nosso olhar – “Hum! Tudo leva a crer que foi o(a)...”.


A leitura me fez refletir sobre o perigo de tirarmos conclusões precipitadas com base em algumas poucas informações e que, muitas vezes, se mostram falsas mais à frente, embora, à primeira vista, tenham nos parecido indiscutíveis.


Percebo que isso ocorre na nossa sociedade e em algumas organizações. No tema vacina e medicamentos para combater a COVID19, somos bombardeados pelos diversos canais de mídia com informações diferentes e, muitas vezes, antagônicas. A vacina tal não funciona porque é chinesa; o plano de vacinação é ruim, pois é do governo e eu não o apoio; o estudo que antes comprovou que o medicamento x é eficaz contra o vírus, agora é desmentido pelos próprios envolvidos etc. Isso sem contar que mídias distintas relatam um mesmo fato mostrando vieses e interpretações diferentes.


Acredito que tirar conclusões rápidas, sem analisar cuidadosamente a informação e suas fontes, é uma das causas (se não a principal) da polarização que temos no país, escancarada nas mídias sociais. É o posicionamento político desconsiderando a ciência, os fatos e dados.


Vejam esse “Conto Tradicional Alemão”: Um homem cujo machado tinha desaparecido, suspeitou do filho do vizinho: o garoto caminhava como ladrão, se vestia como ladrão e falava como ladrão. Mas o homem encontrou seu machado quando cavava uma fossa no vale. Na próxima vez que viu o filho do vizinho, o garoto caminhava, se vestia e falava como qualquer outro garoto.


Acho brilhante, por expor o que pode acontecer conosco. Ah! Sim, “conosco” exceto com você, claro!


Nas organizações, o risco de usarmos poucas evidências e gastarmos pouco tempo, seja para concluir que determinado colaborador é fantástico ou que tem baixo potencial, é sempre muito grande e o fazemos com base em poucas e frágeis informações. E as consequências quase sempre serão ruins.


Você talvez já tenha vivenciado essa situação: você está num grupo, na empresa, e alguém começa a falar mal ou de um colega ausente ou de algum aspecto da organização. Daí outra pessoa complementa a fala do primeiro com o já famoso “inclusive, teve um dia que...” e coloca mais informação para corroborar a ideia inicial. Você que, suponhamos, não tinha nada contra o colega ou não criticava tal aspecto organizacional, fica, no mínimo, com dúvida e pensando “como eu não tinha percebido isso antes?” ou “como eu sou ingênuo!”.


E a situação pode acontecer “para o bem” também! Chega um novo Diretor na empresa. Em pouco tempo os resultados sob sua responsabilidade começam a melhorar e logo alguém conclui “impressionante a capacidade dessa pessoa; certamente, daqui para frente, será só sucesso!”. E se esse pensamento se propaga, logo se torna uma verdade inquestionável.


Em seu livro “Rápido e Devagar – duas formas de pensar”, Daniel Kahneman nos explica sobre os vieses de confirmação, disponibilidade e outros.

  • Viés de confirmação: eu seleciono, de tudo que escuto, aquilo que confirma ideias pré-concebidas que tenho; e dou pouca atenção, ou refuto imediatamente, as que não se encaixam. Ex.: eu acho que meu Diretor é uma pessoa agressiva e arrogante e então, naturalmente, prestarei mais atenção às informações e aos fatos que confirmarão isso.

  • Viés de disponibilidade: supervalorizo eventos que parecem ocorrer com muita frequência, quando na verdade eles apenas estão mais visíveis (disponíveis) pela atenção que a ele deram. Ex.: é fato que morrem muito mais pessoas em acidentes de carro do que de avião; porém, como os acidentes de avião recebem enorme atenção da mídia, posso achar que é muito mais inseguro viajar de avião do que de carro.

Afinal, líder, quem é o culpado?

Penso que cabe às lideranças nas organizações, ao disseminar todo tipo de informação, ao emitir opinião sobre a competência de alguém, ao conduzir um processo de avaliação de desempenho, ser cuidadoso na análise das informações que serão utilizadas para suas conclusões.


Trabalhar com fatos e dados e, mais, questionar os fatos e dados para garantir a sua veracidade e o correto uso. Combater a disseminação de fake news, questionar as pessoas quanto às suas fontes, quando uma informação parece duvidosa; pedir fatos e dados que atestem sua veracidade e validade; ouvir todas as partes envolvidas e não somente as que mais agradam – como diz um amigo meu, “se você só ouvir a Chapeuzinho Vermelho, o lobo sempre será mau”.


Leia o livro até o fim, não tire conclusões precipitadas. Sua ação, líder, pode significar a diferença entre a aplicação da justiça, do respeito e da confiança e a leviandade, o radicalismo e a desconfiança.


Como você observa sua ação nessa área?


Escrito por Ismael Almeida Iba – Consultor da DorseyRocha Consultoria. Formado em Matemática com MBA em Gestão Empresarial pela FGV. Certificado em Coaching pelo ICI Integrated Coaching Institute. Professor na BSP Business School São Paulo.

16 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comentários


bottom of page